Unidades de emergência

O drama de quem espera por atendimentos

O drama de quem espera por atendimentos

Fotos: Nathália Schneider

​​​Os serviços de pronto-atendimento do município vêm passando por uma superlotação desde o final de março. Segundo informações da Secretária de Saúde de Santa Maria, em torno de 300 atendimentos por dia são feitos na Unidade de Pronto-Atendimento (UPA 24h), em média 200 consultas no Pronto Atendimento do Bairro Tancredo Neves (PA Ruben Noal) e quase 400 atendimentos no PA do Bairro Patronato. A maior procura pelos serviços são ocasionados por vários fatores, entre eles as síndromes respiratórias, causadas pelas mudanças de temperatura, o surto de dengue e o aumento de casos de Influenza. O PA do Patronato, local que tem uma maior demanda da saúde pública da cidade, enfrenta nestes últimos meses um aumento de quase 200% nos atendimentos na ala infantil e adulta, conforme informações da coordenadoria do Pronto-Atendimento. No entanto, as longas filas persistem na parte pediátrica, como constado pela reportagem que esteve no local na tarde da última terça-feira.


Em Santa Maria, nos serviços de urgência e emergência, a procura por médicos pediatras já vem persistindo há algum tempo. De acordo com o secretário de Saúde do município, Guilherme Ribas, uma das alternativas para diminuir a sobrecarga do sistema é fazer escalas mistas, com pediatras e clínicos gerais, que já tenham experiência em atendimentos voltados para as Estratégias de Saúde e da Família (ESFs). Contudo, no PA do Patronato, existe uma dificuldade em fechar mensalmente a escala pediátrica.


A reportagem esteve na tarde da última terça-feira no local para acompanhar as dinâmicas do PA e escutar os relatos de pacientes, que, em sua maioria, constataram a demora de horas para consultas na ala infantil.


“Falta de pediatras é uma questão nacional”, diz coordenação do PA do Patronato


Conforme a coordenadora do PA do Patronato, Verônica Martins Camargo, a escala da parte infantil conta com seis pediatras: um está de atestado no momento. Já o objetivo para o mês de junho é ter quatro pediatras para o turno da manhã, da tarde e da noite. Igual a ala adulta, que já está com a escala fechada de clínicos gerais:


– A situação da falta dos pediatras é uma questão nacional e nós temos uma dificuldade como todo país. Muitos não estão trabalhando na área do Sistema Único de Saúde (SUS). No mês de junho, estamos contando com os médicos rotineiros, que é um médico específico para crianças que estão em observação e vão para atendimentos hospitalares, além da ajuda dos clínicos gerais, mas mesmo assim, estamos com dificuldades.


A coordenadora afirma que todas as medidas são tomadas para diminuir o tempo de espera. Durante a conversa com a reportagem, Verônica emocionou-se algumas vezes, contando que, em alguns dias, durante a noite, precisa ir na sala de espera conversar com os pais, por causa da sobrecarga, como ocorreu na segunda e terça-feira à noite. No entanto, às vezes, recebe palavras de ódio das pessoas que estão na fila de espera.


Ao ser questionada sobre a falta de pediatras no último domingo (28), a coordenadora coloca que, quando não tem o médico especialista no PA do Patronato, obrigatoriamente a UPA 24h vai ter e que os pacientes podem ser encaminhados para lá de ambulância. 



Medidas   

A prefeitura, por meio da Secretaria de Saúde, esclarece que todos os pacientes passam pela triagem e recebem uma classificação de cores (azul, verde, amarelo, laranja e vermelho), conforme a situação de urgência e emergência para os atendimentos. O secretário de Saúde do município, Guilherme Ribas, descreve que com a maior demanda nestes últimos meses, fichas que deveriam ser verdes, se transformam em amarelas, pelo grau de avaliação, o que torna os atendimentos mais lentos.


– A pediatria vem, ano após ano, não tendo mais profissionais disponíveis no mercado e os municípios vêm fazendo alternativas de ter profissionais clínicos gerais que tenham essa ênfase do atendimento pediátrico para avançar no processo. Além disso, a demora também é ocasionada pelos exames. A dengue é um exemplo, que está na rede pública e privada, o teste para detectar o antígeno, que demora em torno de três horas. Muitos pacientes precisam ser reavaliados antes de serem liberados. E nesse fluxo, muitos pacientes ficam ali para serem reavaliados e isso vai demandando ter estrutura físicas para suportar o número de pacientes – ressalta Ribas.


Em julho de 2022, o secretário de Saúde comenta que uma tentativa de ter mais pediatras foi aumentar o valor das horas em 20,83%, na UPA 24h. Porém, não surtiu o resultado esperado.


– Estamos dialogando com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e com os profissionais que já se formaram e querem fazer residência de pediatria, apoiando os médicos que já temos nas redes. Sabemos das dificuldades deste núcleo, por isso estamos tentando que os profissionais da Policlínica Central, na Cacism (Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Santa Maria) fiquem com os atendimentos classificados como azuis e verdes (grau de risco menor) – explica o secretário de saúde.


Residência no Hospital Universitário de Santa Maria (Husm)

Para atuar como médico(a) pediatra, o profissional precisa realizar uma especialização na área. Desde 1968, a UFSM, por meio do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), forma médicos residentes em Pediatria. A médica e supervisora desta residência, Glauce Mariane Bittencourt Mendes concorda que existe uma falta nacional de pediatras, mas a UFSM é uma das maiores formadoras desta especialização no Estado.    


Apesar de o meio acadêmico de Santa Maria formar um número considerável de pediatras, muitos estudantes não são da cidade e acabam optando por ir embora, por diversos fatores, como a quantidade de demanda e o salário, que em cidades com mais habitantes, é maior. 


O número de médicos formados na residência médica em Pediatria do Husm nos últimos cinco anos: 

  • 2019 – 10
  • 2020 – 10 
  • 2021 – 0* 
  • 2022 – 11
  • 2023 –  12

* Não houve residentes formados neste ano pois ocorreu alteração no tempo de formação dos residentes em pediatria de 2 para 3 anos, conforme determinação da CNRM/MEC.


 Atendimentos PA Patronato

  • 11 leitos adultos e 11 leitos infantis
  • Em torno de 400 por dia (adulto e pediátrico junto)
  • Conta com seis pediatras
  • Março (atendimentos) – 10.523
  • Abril – 10.747
  • Maio – 11.641

É recomendado procurar os pronto-atendimentos em caso de*:

  • Dores fortes
  • Enxaqueca
  • Dificuldades de respirar
  • Febre alta, acima de 39ºC
  • Fraturas e cortes com pouco sangramento
  • Cólicas renais
  • Crises Convulsivas
  • Vômito constante 

*Informações do site do Ministério da Saúde​

Longas filas e horas de espera pelas consultas

Letícia Molina dos Santos estava com a filha de 5 meses, Cecilia Antunes Molina esperando por atendimento


Na última terça-feira, a reportagem chegou ao PA do Patronato às 14h40min. De imediato, famílias começaram a relatar que estavam com os filhos desde às 10h e tinham acabado de sair da consulta. Um destes casos foi com uma moradora do Bairro Juscelino Kubitschek, que estava com a filha de colo, desde às 10h. Às 15h09min, elas tinham acabado de sair da consulta. A mãe, que preferiu não se identificar, comentou que outro dia procurou o serviço de atendimento e teve que ir embora, porque não tinha médico pediatra no local. Na terça, antes de ir para o pronto-atendimento, ligou para a Unidade Básica de Saúde (UBS) do bairro em que mora, mas informaram a falta do médico especialista e as consultas não estavam sendo marcadas. A recomendação foi procurar o PA.


Outra mãe que foi recomendada a ir para o serviço de urgência foi a autônoma Letícia Molina dos Santos, 18 anos, que estava com a filha de 5 meses, Cecilia Antunes Molina.  


– Estou aqui desde às 12h e sai da consulta agora (15h24min), mas estou em função com ela a madrugada inteira. O pediatra dela receitou um antibiótico, mas ela começou a piorar de madrugada, até se afogou com um catarro (secreção). O médico recomendou que se ela piorasse era para vir ao PA. No atendimento falaram que era um caso viral, deram paracetamol e pediram para ajudar a eliminar a secreção, só que eu esperei mais de três horas e a consulta demorou menos de cinco minutos. Eu moro na Tancredo Neves, mas tem muitas mães que não conseguem vir aqui, só para receber que está tudo bem, mas nos preocupamos que algo pior aconteça.


A sobrecarga na ala pediátrica também foi constatada na última segunda-feira, como conta o motorista de caminhão Anderson Lucas Crema Silva, 41 anos, que esteve nos dois dias com os filhos recém-nascidos Henri e Heitor, junto com a esposa, a auxiliar de limpeza Camila Fagundes Mota, 28 anos, e a filha Kemilyn Fagundes, 1 ano e 10 meses. A família buscou atendimento para os bebês na segunda, mas acabou desistindo, porque começou uma confusão com alguns pais e a coordenadoria do PA em relação a demora.


– Ontem (segunda-feira) passamos um bom pedaço da tarde aqui, passamos pela triagem e com a confusão decidimos ir embora. Hoje, chegamos às 14h40min, mas os recém-nascidos têm prioridade e ainda não conseguimos ser atendidos (às 15h15min). Estamos com a nossa filha mais velha em casa com H1N1 e estamos com medo, porque eles estão com muito coriza.  


A família conseguiu prioridade no atendimento e, às 16h06min, estavam na consulta. Na tarde em que a reportagem esteve no local, dois médicos pediatras estavam atendendo, diferente de segunda-feira, que tinha apenas um. Segundo informações da coordenadoria do PA, no dia 30 de maio, do meio-dia às 16h, 100 crianças tinham passado pelo serviço de saúde. Às 16h, 22 crianças estavam na sala de espera e duas foram classificadas como urgentes, por causa dos problemas respiratórios apresentados. 


Anderson Lucas Crema Silva e Camila Fagundes Mota estavam com os dois filhos recém-nascidos Henri e Heitor, junto com a filha Kemilyn Fagundes, 1 ano e 10 meses


Demora  

Por volta das 17h30min a ala pediátrica, que tinha começado a fluir mais os atendimentos, voltou a aumentar a demanda. As famílias que chegavam ficavam preocupadas com a superlotação. A parte infantil começou a misturar-se com a adulta e assim permaneceu até a reportagem sair do local, por volta das 18h15min.


​O pintor Cleberson Da Costa, 43 anos, saiu para comprar salgadinhos para a filha, Giovana, de 6 anos, que já estava tentando encontrar algo para se distrair enquanto aguardava. Eles estavam lá desde as 15h, mas perto das 18h ainda não tinham consultado. A pequena estava com tosse, um pouco de febre e dor de cabeça. A reportagem entrou em contato com Cleberson no dia seguinte para saber quanto tempo demorou para o atendimento:


Não consultamos, viemos embora. A coordenadora (Verônica Martins Camargo) durante a parte da noite conversou com o pessoal que estava na sala de espera. Ela disse que iria demorar para todos serem atendidos, porque os dois médicos não estavam dando conta da demanda. Também falou para irmos fazer reclamação para os órgãos públicos, caso alguém ali quisesse. Desistimos da consulta às 19h30min mais ou menos – afirma o pintor.


Quem também esteve presente nesta fala da coordenadora, foi a aposentada Cirlei de Jesus da Silva, 65 anos, que estava com a neta Lívia Beatriz Encarnação, de 2 anos, desde às 13h20min. Lívia estava com dor no corpo, tosse e febre. Às 17h, Cirlei foi informada que ainda tinham oito crianças na frente delas. 


– Conseguimos ser atendidas às 18h40min, mais de cinco horas esperando, deu tudo certo. A coordenadora do PA foi lá conversar com a gente, falou da demanda, comentou que o adulto estava mais tranquilo. Mas a falta de pediatra prejudica. Achei legal ela vir explicar, faz parte do serviço. E gostamos muito do atendimento pediátrico – reforça Cirlei.


Quando a reportagem saiu do local, por volta das 18h15min, mais de oito pessoas estavam na frente do PA, porque na sala de espera da área infantil já não tinha mais lugar para sentar. Além disso, uma família com duas crianças, avisou que estava desistindo de esperar, pois estavam no local há mais de três horas e relataram a reportagem sobre as crianças que estavam desde às 13h na ala, como a Lívia, e ainda não tinham sido chamadas. 

Em quatro horas, cerca de 160 pessoas são atendidas na Ala Adulta do PA 


Apesar de a falta de pediatras no Pronto-Atendimento do Patronato ser um dos principais fatores para a superlotação, a ala adulta também aumentou a demanda pelos serviços de urgência e emergência.


Doenças respiratórias comuns com a chegada do inverno, neste ano, acabaram juntando-se com os casos de dengue, com a Influenza e ainda a preocupação pela Covid-19, o que levou a sobrecarga dos serviços de pronto-atendimento da cidade. Na última terça-feira, desde às 12h até por volta das 16h, pelo menos 160 adultos já tinham passado pelo atendimento e ainda sete pacientes estavam na sala de espera do PA.


Atendimento


Mesmo com a chegada de mais pacientes buscando assistência no local, desde o horário que a reportagem chegou ao local, por volta das 14h40min, até o final da tarde, os pacientes já tinham mudado, ou seja, quem chegou no início da tarde já havia sido atendido e liberado. Cenário bastante diferente da parte pediátrica, em que famílias que haviam chegado antes da reportagem no local e continuavam sentadas esperando pelo atendimento.

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